sexta-feira, 6 de novembro de 2009

Tributação de mais-valias em acções

O programa do governo veio trazer novamente para a ordem do dia um tema antigo relacionado com a forma e o peso da tributação das mais-valias em acções. Para fazer uma análise séria desta questão é necessário abstrairmo-nos das considerações ideológicas que confrontam os apologistas do “capital” (que afirmam que haverá uma hemorragia de capitais se a tributação for agravada) e os detractores do “capital” (que afirmam que a desproporção entre a tributação do capital e dos trabalhadores não faz qualquer sentido). Vamos aos factos: (i) a tributação das mais-valias em Portugal é das mais favoráveis do Mundo (é zero para quem detenha acções há mais de um ano); (ii) os mercados de capitais e os investidores são, de facto, muito sensíveis a alterações que se façam nas taxas de tributação; e (iii) o País está globalmente descapitalizado e precisa de continuar a atrair capital (sobretudo estável), tendo necessidade de ser competitivo também neste campo. Partindo destes factos a Alice não vê qualquer alternativa a enveredar por uma solução que tribute mais as pessoas que têm uma visão de curto prazo do mercado accionista mas que mantenha um nível de tributação baixo para quem tenha uma visão de longo prazo. Julgo que a ninguém escandalizaria (e a Alice não acredita que tal constituiria justificação para um grande êxodo de capitais) que a tributação fosse feita por um mecanismo, por exemplo, deste género: (i) Acções detidas há menos de 1 ano – 20%; (ii) Acções detidas entre 1 e 2 anos – 15%; Acções detidas entre 2 e 3 anos – 10%; Acções detidas entre 3 e 5 anos – 5%; Acções detidas há mais do que 5 anos – 0%. Seria também da mais elementar justiça que a Administração Fiscal permitisse, na esfera individual dos contribuintes, a utilização das menos-valias fiscais para reduzir a sua factura fiscal ou, no mínimo, a utilização em exercícios seguintes das menos-valias geradas num determinado exercício (ainda que apenas para fazer o “offset” com futuras mais-valias). A medida faz sentido (a minha costela “capitalista” não me permite aplaudir a iniciativa), mas agora terá que ser bem aplicada para minimizar os efeitos da saída de capitais (que acontecerá sempre) e com um “timing” razoavelmente longo de adaptação para permitir às pessoas analisar qual vai ser o seu posicionamento em matéria fiscal.

1 comentário:

Unknown disse...

Só um comentário de natureza técnica: a utilização de menos-valias realizadas no ano n para deduzir a mais-valias do ano n+1 é teoricamente possível, no CIRS, desde que optes pelo englobamento das ditas.

O problema prático resulta do facto de teres de englobar juros e dividendos ("grosso modo") em simultâneo. Ainda assim, pode haver circunstâncias em que vale a pena exercer essa opção.