A Alice já vem falando deste tema desde Agosto de 2009 (ver
aqui), que considera de importância fulcral para o crescimento da economia. Não é demais recordar que o último período da nossa história em que o crescimento foi mais acentuado coincidiu com o período de grande desenvolvimento da Bolsa Nacional (ainda se recordam das célebres 7 OPVs da SONAE em 1987?
Na altura, a Alice prometeu desenvolver o tema um pouco mais e daí este post que foca em especial o mercado Alternext.
Enquadramento
As Empresas Portuguesas enfrentam severos constrangimentos ao desenvolvimento da sua actividade, dos quais a insuficiência de capitais é um dos mais importantes.
Assim, nesta matéria, assiste-se genericamente a:
- Deficiente capitalização das Empresas (fundos próprios dos promotores / accionistas insuficientes);
- Dificuldade de acesso a crédito bancário (bancos também com problemas de capitalização e liquidez) ou a fontes de financiamento alternativas (mercado de capital de risco exíguo);
- Nalguns sectores, como por exemplo no caso das Empresas de base tecnológica ou de Empresas baseadas em conhecimento que não dispõem de activos tangíveis, esta dificuldade é ainda mais aguda.
Por outro lado, o Estado encontra-se também circunscrito no tipo de ajudas que pode facultar às Empresas que sofrem das limitações acima referidas:
- Critérios comunitários que fundamentam os apoios (muito direccionados para PMEs e para áreas geográficas delimitadas);
- Sobrecarga do erário público;
- Maior escrutínio dos apoios concedidos e dos seus destinatários;
O mercado Alternext
O mercado Alternext encontra-se integrado na NYSE / Euronext e foi desenhado especificamente para acolher PMEs. Não abdicando do essencial para garantir a protecção dos investidores e assegurar a liquidez do mercado, tem regras de admissão mais simples e de menor custo para as Empresas do que o mercado dito tradicional.
Este mercado foi lançado em Maio de 2005 e conta actualmente com cerca de 200 Empresas cotadas nas praças de França, Bélgica e Holanda. Dos sectores mais representativos destacam-se o Tecnológico e o Industrial.
Estão catalogados mais de 200 investidores institucionais de 30 países diferentes que se especializam neste mercado, sendo que cerca de 50% são Franceses. Existem alguns investidores de dimensão considerável que prestam uma atenção particular a este segmento de mercado, sendo de destacar: Allianz, Axa, Natixis, Rothchild, JP Morgan, etc.
O Alternext em Portugal – Dificuldades de implementação
Pese embora o esforço de divulgação feito ao longo dos últimos 7 anos pela equipa da Euronext de Lisboa, apenas existe uma Empresa cotada no mercado Alternext em Portugal (a ISA - Intelligent Sensing Anywhere, S.A., que foi para o mercado no ano passado).
As principais razões para este facto são as seguintes:
- Dificuldade em demonstrar junto das potenciais Empresas a colocar no mercado os benefícios da cotação;
- Falta de massa crítica numa fase inicial para que entre rapidamente em velocidade cruzeiro;
- Falta de interesse por parte dos intermediários financeiros em promover este mercado;
- Não existem em Portugal investidores especializados neste tipo de activos (nem aparecerão enquanto o mercado não existir…).
Enquanto não se quebrar o ciclo vicioso de não há Empresas, … não há intermediários, … não há investidores, … não há mercado, não há Empresas …, o mercado Alternext terá dificuldade em arrancar em Portugal.
Benefícios para a Economia
A criação de mecanismos alternativos para a capitalização das Empresas, nomeadamente via Alternext, é fundamental para apoiar os desígnios estabelecidos para a Economia Portuguesa de: (i) criação de Emprego; (ii) internacionalização das Empresas; (iii) apoio às PMEs; (iv) melhoria qualitativa do tecido empresarial; e (v) aumento da transparência do tecido Empresarial.
O enquadramento destes novos mecanismos deverá ter em conta o seguinte:
- A capitalização adequada das Empresas, sobretudo das PMEs, é fundamental ao seu crescimento sustentável, com geração de Emprego e melhoria do seu posicionamento competitivo, interno e externo;
- É fundamental existirem mecanismos alternativos que permitam e promovam esta capitalização, atendendo a que os mecanismos actualmente existentes têm-se revelado exíguos;
- Estes mecanismos alternativos deverão funcionar independentemente dos intermediários financeiros instalados no mercado e, desejavelmente, do sector público;
- Ainda que haja alguma participação pública, num momento inicial, esta deverá ter como principal objectivo a indução do aparecimento desses mesmos mecanismos alternativos, garantindo a total transparência de métodos de actuação e de critérios de decisão;
Formato para a Implementação em Portugal
Há fundamentalmente duas restrições que urge resolver para que o mercado Alternext possa arrancar em Portugal:
- Reunir um conjunto de Empresas para avançar simultaneamente para cotação no mercado Alternext (assegurando um mínimo de massa crítica deste o momento de arranque do mercado);
- Reunir um conjunto de investidores disponíveis para investir nas primeiras emissões deste novo mercado.
Relativamente ao primeiro ponto, a questão essencial será seleccionar e desafiar um conjunto de Empresas (num mínimo de 10) credíveis, que se constituam como “Empresas modelo” do seu sector e do tecido empresarial Português, com um percurso que interesse valorizar (ex. crescimento do Emprego, aposta em I&D, internacionalização da sua actividade, tecnológicas, etc.). Estas Empresas seriam “Pioneiras” deste mercado e a pertença a este clube restrito constituíria, só por si, uma distinção. Em todo o caso, importaria haver um apoio a este conjunto de Empresas, seja pela via fiscal, seja pela comparticipação nos custos desta acção.
Relativamente ao segundo ponto, sem prejuízo da captação de investidores privados, sempre essenciais a que um mercado deste género funcione de uma forma saudável, haverá necessidade de canalizar um conjunto de fundos públicos que assegure a primeira fase de dinamização do mercado. Assim, seria essencial:
- Do lado do investimento privado: incentivos fiscais para trazer investidores para este mercado;
- Do lado do investimento público: criação de um fundo autónomo para investimentos exclusivos no mercado Alternext, desejavelmente de gestão privada; a ser complementado por fundos semelhantes geridos por duas ou três entidades públicas com vocação para este tipo de investimentos, como por exemplo a CGD ou o Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social.
A título meramente exemplificativo do potencial de indução deste modelo, podemos considerar que um Fundo autónomo de apenas cerca de €30 milhões, complementado com alocações semelhantes de mais 2 entidades públicas permitiria ter disponíveis cerca de €100 milhões para arrancar com este mercado, o que seria suficiente para financiar a cotação de cerca de 25 Empresas (considerando que a colocação média de OPV é de cerca de €4 milhões e o conjunto dos Fundos públicos não deveriam tomar mais de metade do valor da colocação).
A Alice entende que há poucas medidas com a capacidade de mudar atitudes, consciências e práticas tão eficazes como estas que aqui se apresentam. Esperemos que, ao fim de 7 anos, seja o momento para as colocar em prática.