quinta-feira, 23 de maio de 2013

A Bolsa é a nossa salvação?



O Ministro da Economia anunciou ontem a aposta na Bolsa para reforçar o capital das Empresas, com especial destaque para as PMEs. É uma decisão no bom sentido e sinal de que o Governo começa a levantar cabeça. 

A Alice já vem falando deste tema desde Agosto de 2009 (ver aqui), que considera de importância fulcral para o crescimento da economia. Não é demais recordar que o último período da nossa história em que o crescimento foi mais acentuado coincidiu com o período de grande desenvolvimento da Bolsa Nacional (ainda se recordam das célebres 7 OPVs da SONAE em 1987? 

Na altura, a Alice prometeu desenvolver o tema um pouco mais e daí este post que foca em especial o mercado Alternext. 

Enquadramento 

As Empresas Portuguesas enfrentam severos constrangimentos ao desenvolvimento da sua actividade, dos quais a insuficiência de capitais é um dos mais importantes. 

Assim, nesta matéria, assiste-se genericamente a: 

  • Deficiente capitalização das Empresas (fundos próprios dos promotores / accionistas insuficientes); 
  • Dificuldade de acesso a crédito bancário (bancos também com problemas de capitalização e liquidez) ou a fontes de financiamento alternativas (mercado de capital de risco exíguo); 
  • Nalguns sectores, como por exemplo no caso das Empresas de base tecnológica ou de Empresas baseadas em conhecimento que não dispõem de activos tangíveis, esta dificuldade é ainda mais aguda. 

Por outro lado, o Estado encontra-se também circunscrito no tipo de ajudas que pode facultar às Empresas que sofrem das limitações acima referidas: 

  • Critérios comunitários que fundamentam os apoios (muito direccionados para PMEs e para áreas geográficas delimitadas); 
  • Sobrecarga do erário público; 
  • Maior escrutínio dos apoios concedidos e dos seus destinatários; 

O mercado Alternext 

O mercado Alternext encontra-se integrado na NYSE / Euronext e foi desenhado especificamente para acolher PMEs. Não abdicando do essencial para garantir a protecção dos investidores e assegurar a liquidez do mercado, tem regras de admissão mais simples e de menor custo para as Empresas do que o mercado dito tradicional. 

Este mercado foi lançado em Maio de 2005 e conta actualmente com cerca de 200 Empresas cotadas nas praças de França, Bélgica e Holanda. Dos sectores mais representativos destacam-se o Tecnológico e o Industrial. 

Estão catalogados mais de 200 investidores institucionais de 30 países diferentes que se especializam neste mercado, sendo que cerca de 50% são Franceses. Existem alguns investidores de dimensão considerável que prestam uma atenção particular a este segmento de mercado, sendo de destacar: Allianz, Axa, Natixis, Rothchild, JP Morgan, etc. 


O Alternext em Portugal – Dificuldades de implementação 

Pese embora o esforço de divulgação feito ao longo dos últimos 7 anos pela equipa da Euronext de Lisboa, apenas existe uma Empresa cotada no mercado Alternext em Portugal (a ISA - Intelligent Sensing Anywhere, S.A., que foi para o mercado no ano passado). 

As principais razões para este facto são as seguintes: 

  • Dificuldade em demonstrar junto das potenciais Empresas a colocar no mercado os benefícios da cotação; 
  • Falta de massa crítica numa fase inicial para que entre rapidamente em velocidade cruzeiro; 
  • Falta de interesse por parte dos intermediários financeiros em promover este mercado; 
  • Não existem em Portugal investidores especializados neste tipo de activos (nem aparecerão enquanto o mercado não existir…). 

Enquanto não se quebrar o ciclo vicioso de não há Empresas, … não há intermediários, … não há investidores, … não há mercado, não há Empresas …, o mercado Alternext terá dificuldade em arrancar em Portugal. 

Benefícios para a Economia 

A criação de mecanismos alternativos para a capitalização das Empresas, nomeadamente via Alternext, é fundamental para apoiar os desígnios estabelecidos para a Economia Portuguesa de: (i) criação de Emprego; (ii) internacionalização das Empresas; (iii) apoio às PMEs; (iv) melhoria qualitativa do tecido empresarial; e (v) aumento da transparência do tecido Empresarial. 

O enquadramento destes novos mecanismos deverá ter em conta o seguinte: 

  • A capitalização adequada das Empresas, sobretudo das PMEs, é fundamental ao seu crescimento sustentável, com geração de Emprego e melhoria do seu posicionamento competitivo, interno e externo; 
  • É fundamental existirem mecanismos alternativos que permitam e promovam esta capitalização, atendendo a que os mecanismos actualmente existentes têm-se revelado exíguos; 
  • Estes mecanismos alternativos deverão funcionar independentemente dos intermediários financeiros instalados no mercado e, desejavelmente, do sector público; 
  • Ainda que haja alguma participação pública, num momento inicial, esta deverá ter como principal objectivo a indução do aparecimento desses mesmos mecanismos alternativos, garantindo a total transparência de métodos de actuação e de critérios de decisão; 

Formato para a Implementação em Portugal 

Há fundamentalmente duas restrições que urge resolver para que o mercado Alternext possa arrancar em Portugal: 

  • Reunir um conjunto de Empresas para avançar simultaneamente para cotação no mercado Alternext (assegurando um mínimo de massa crítica deste o momento de arranque do mercado); 
  • Reunir um conjunto de investidores disponíveis para investir nas primeiras emissões deste novo mercado. 

Relativamente ao primeiro ponto, a questão essencial será seleccionar e desafiar um conjunto de Empresas (num mínimo de 10) credíveis, que se constituam como “Empresas modelo” do seu sector e do tecido empresarial Português, com um percurso que interesse valorizar (ex. crescimento do Emprego, aposta em I&D, internacionalização da sua actividade, tecnológicas, etc.). Estas Empresas seriam “Pioneiras” deste mercado e a pertença a este clube restrito constituíria, só por si, uma distinção. Em todo o caso, importaria haver um apoio a este conjunto de Empresas, seja pela via fiscal, seja pela comparticipação nos custos desta acção.

Relativamente ao segundo ponto, sem prejuízo da captação de investidores privados, sempre essenciais a que um mercado deste género funcione de uma forma saudável, haverá necessidade de canalizar um conjunto de fundos públicos que assegure a primeira fase de dinamização do mercado. Assim, seria essencial: 

  • Do lado do investimento privado: incentivos fiscais para trazer investidores para este mercado; 
  • Do lado do investimento público: criação de um fundo autónomo para investimentos exclusivos no mercado Alternext, desejavelmente de gestão privada; a ser complementado por fundos semelhantes geridos por duas ou três entidades públicas com vocação para este tipo de investimentos, como por exemplo a CGD ou o Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social. 

A título meramente exemplificativo do potencial de indução deste modelo, podemos considerar que um Fundo autónomo de apenas cerca de €30 milhões, complementado com alocações semelhantes de mais 2 entidades públicas permitiria ter disponíveis cerca de €100 milhões para arrancar com este mercado, o que seria suficiente para financiar a cotação de cerca de 25 Empresas (considerando que a colocação média de OPV é de cerca de €4 milhões e o conjunto dos Fundos públicos não deveriam tomar mais de metade do valor da colocação).

A Alice entende que há poucas medidas com a capacidade de mudar atitudes, consciências e práticas tão eficazes como estas que aqui se apresentam. Esperemos que, ao fim de 7 anos, seja o momento para as colocar em prática.

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