quinta-feira, 4 de outubro de 2012

Há almoços grátis?


Já sabemos que não, mas quase...

Esta semana vi-me obrigado a almoçar numa daquelas tascas portuenses que, não sendo propriamente típica (não tem pedigree para ostentar tal epíteto), fazia jus à reputação das ditas.

Atraiu-me o luminoso letreiro de versão 'neonesca' com o anúncio: "Menu a €4". Não propriamente empolgante mas, atendendo às minhas limitações de tempo e à míngua de alternativas, embarquei nesta viagem gastronómica inesquecível.

O referido Menu era composto por: sopa, prato principal, copo de vinho e café.

Comecemos então pelo entretém de boca que, nesta modesta refeição, apresentou-se como uma bela sopa de hortaliça. As ditas verduras encontravam-se no seu ponto correcto de cozedura, apresentando-se estaladiças e saborosas, acompanhadas do respectivo caldo que era um primor de equilíbrio entre a finura dos sabores da terra e o sal do seu tempero.

Seguiu-se um filete de pescada que evidenciou uma correcta fritura, sendo o lombo do pescado tenro e suculento. Acompanhou, em total harmonia de sabores, umas apetitosas batatinhas fritas e um arroz agulha que, não deslumbrando, serviu o efeito pretendido (providenciar a energia necessária para o desgaste do resto do dia).

O copo de vinho maduro branco ligou na perfeição com a refeição. Com uma frescura esfusiante, denunciando a presença das castas que lhe deram origem, Rabigato e Malvasia Fina certamente.

O café evidenciou um equilíbrio quase teológico entre arábicas e robustas.

O serviço atencioso e preparado não desiludiu.

No final veio a maior surpresa... A conta... Foi mesmo €4,00, i.e. €3,25 sem IVA.

Tudo para pagar os excelsos ingredientes, as quatro pessoas que andavam a servir, a renda do espaço comercial, mais electricidade, mais água, etc...

Eu criminoso me confesso... Não tive coragem de pedir factura.

Podemos tirar duas conclusões:

1. O País (ou certas áreas) é bem mais miserável do que os argumentistas do filme "andamos a viver acima das nossas possibilidades" que vemos todos os dias na televisão nos querem fazer crer.

2. Provavelmente, o Estado ganharia muito em repor a taxa de IVA da restauração onde ela estava e apostar na rigorosa fiscalização da sua aplicação (A ASAE poderia tratar disto em vez de estar preocupada com o tamanho correcto do Tomate). Um exemplo de que menos impostos podem ser melhores impostos.

quarta-feira, 3 de outubro de 2012

Esquerda Liberal governa no Brasil?


O mundo está de pernas para o ar. Os que se dizem de esquerda governam à direita e, cada vez mais, temos exemplos do inverso aqui tão perto!

Vem isto a propósito de uma magnifica entrevista de Dilma Roussef ao FT. Vejam a versão integral em http://www.ft.com/cms/s/0/c76e6180-0c70-11e2-a776-00144feabdc0.html.

Para além de ser implacável com os corruptos - despediu 7 elementos da sua equipa desde que começou o mandato (claro que isto tem que ver com princípios e não com políticas, mas nunca é por demais realçar a coragem que uns têm e outros não), evidencia uma
sagacidade prática na gestão da "vida real" que, confesso, me deixa um pouco invejoso.

Vejamos os principais "highlights", cuja escolha são da minha lavra, sobre políticas económicas:


- posição desassombrada, desafiante até, face aos EUA e a sua agressiva política monetária e cambial (que classifica de concorrência desleal).


 Redução dos impostos sobre o trabalho (já ocorreram em mais de 40 sectores e em vias de ser alargados aos restantes), nas palavras dela: "não podemos penalizar quem dá trabalho às pessoas..."


- Privatização de infra-estruturas: já vendeu os aeroportos de São Paulo, Campinas, Brasília e seguem-se varias concessões nas estradas e caminhos de ferro. Os Portos virão a seguir...

- impôs cortes de preços no sector privado, nomeadamente nas "utilities" (sobretudo electricidade) e nos custos de financiamento bancário.

Tudo isto, num Presidente de esquerda...
Ah! E quase me esquecia, numa coligação governamental de 10 partidos...



terça-feira, 2 de outubro de 2012

Economia do Mar

Deus ao mar o perigo e o abismo deu,
Mas nele é que espelhou o céu.
Fernando Pessoa

Tenho sido um leitor assíduo e atento da série "Mar Português" que o Jornal Público tem dado à estampa.

Na edição de ontem explicou-se que a "extensão da plataforma continental" permitirá o crescimento do espaço marítimo sob jurisdição Portuguesa até quase 4 milhões de km quadrados (face aos actuais 1,6 milhões). Diz-se no artigo que Portugal ficará no top20 dos países com maior território em termos mundiais e que corresponderá à dimensão actual da Índia!

Isto tudo deve-se à Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar que se encontra em vigor desde 1994. Portugal preparou até 2009 uma candidatura para a extensão da sua plataforma, candidatura essa, que deverá começar a ser avaliada em 2015/2016 para termos uma decisão final lá para 2018.

Esta extensão é importante pelo facto de haver recursos no Mar que poderão revelar-se muito valiosos. Provavelmente não será ainda o tão almejado petróleo mas metano, metais preciosos, etc. já existem comprovadamente. Haverá também outras preciosidades que porventura hoje não reconhecemos como tal!

Percebo muito pouco de água em geral e de mar em particular (para além de, por vezes, meter alguma), mas este projecto soa-me lógico e promissor. Regozijo-me por Portugal estar apostado num projecto de longo prazo e que tem atravessado vivo diversas legislaturas e governos. Pensássemos assim em mais áreas e, estou certo, conseguiríamos muito rapidamente dar a volta aos nossos problemas.

Uma nota final (reforçando a ideia de pensar nas coisas a longo prazo) para dizer que o actual Secretário de Estado do Mar, Manuel Pinto de Abreu, chefiou os trabalhos técnico-científicos na base do alargamento do espaço marítimo Português. Faz sentido...

segunda-feira, 1 de outubro de 2012

Impostos Aceitáveis (?)


O Governador do Banco de Portugal defendeu que "o dever da comunidade é saber o que é aceitável em termos de esforço tributário".

Definir direitos e deveres individuais é uma tarefa extremamente dificil no contexto de uma comunidade (veja-se o exemplo do uso do véu em França). Definir "Deveres" de uma comunidade é uma coisa etérea e de concretização quase impossível!

Como se faz?

Uma sondagem?, com a pergunta: "qual o nível de impostos que considera aceitável suportar?". Algo me diz que as respostas seriam unânimes (quer a sondagem fosse feita aqui ou na cochinchina!).

Um estudo de mercado?, certamente feito pelas maiores consultores internacionais (e com preço correspondente).

Uma análise detalhada de assiduidade nas sucessivas manifestações (as passadas e futuras)? Certamente existirão algoritmos sofisticados capazes de avaliar o nível de adesão a cada uma das manifestações à medida que os vários "pacotes" forem sendo anunciados.

Um referendo? Presumo que tivesse o mesmo resultado da sondagem...

A questão está, obviamente, mal enquadrada...

A Comunidade vota em eleições livres em determinada equipa que, supostamente, tem um plano a cumprir durante quatro anos. E esse plano comportará um conjunto de opções que traduzem os desejos da Comunidade (mais segurança, mais saúde, menos educação, etc.). Num mundo ideal, cada votante será conhecedor das opçoes em discussão e qual o seu custo. Parte-se do principio que a equipa eleita cumprirá o seu programa, com o menor custo possível e, consequentemente, com a imposição do mínimo de impostos sobre a Comunidade. Os impostos "aceitáveis" serão aqueles estritamente necessários para garantir a prestação de serviços que a Comunidade deseja.

O grande problema é que, desde há muito, é impossível a qualquer cidadão compreender qual a relação entre o que paga de impostos e os benefícios que tem como cidadão. A dura realidade é que ela não existe, de facto, nos dias de hoje em Portugal. Temos uma vaga ideia de que descontamos para a segurança social para pagar as pensões dos nossos progenitores (mas não sabemos se haverá dinheiro para pagar as nossas). Sabemos que parte dos nossos impostos é para cumprir serviço de dívida contraída para financiar projectos passados que hoje pouca rentabilidade têm (Scuts? Estádios? Etc.). Sabemos que outra parte financia um sistema de Educação e de Saúde ineficientes, quando muitos recorrem ao ensino e à saúde privados. E os exemplos continuariam se mais tempo tivéssemos...

E, finalmente, há um problema de base. Num País em que o Salário mínimo é de cerca de €500 e o médio é inferior a €1.000, o nível de impostos aceitável é, necessariamente, muito baixo (seja em valor absoluto, seja em percentagem). Comparar níveis de "imposto aceitáveis" entre Portugal e outros países tem que ter este factor em consideração.