terça-feira, 5 de março de 2013

Impacto Económico da Cultura - A Fundação de Serralves


Aviso prévio à navegação: a Economia (e, mais concretamente, as Finanças) desconfia da Cultura. Conversamente, também é correcto afirmar que a Cultura desconfia da Economia.

A Economia considera que os agentes culturais são meros esbanjadores de dinheiros públicos. Verdadeiros sanguessugas da Sociedade, aproveitadores do dinheiro dos contribuintes para perseguirem quimeras existenciais de carácter eminentemente individualista e destinado a um número reduzido de elitistas iluminados. Quando os Economistas querem exemplificar o que dizem acabam sempre por citar o célebre filme "Branca de Neve" do falecido João César Monteiro.

A Cultura, por seu turno, acusa a contraparte de ser economicista (uma outra forma de dizer reducionista), ignorante, desprovida de sensibilidade artística e coarctadora da liberdade de expressão de toda uma geração que, qualquer que seja a sua qualidade, busca a sua forma de expressão num mundo opressor e inimigo da identidade individual.

O excelente estudo sobre o impacto económico da Fundação de Serralves (FS), coordenado pela Porto Business School, lança luz sobre a possibilidade, tão almejada pela Alice, de combinar estas abordagens conflituantes. Com efeito, o estudo divulgado no mês passado permite concluir que a Economia pode ser boa para a Cultura, mas o inverso não é menos verdadeiro.

Senão, vejamos, para o ano de 2010 (base do estudo):
  1. A FS gerou proveitos de cerca de €10 Milhões;
  2. Destes, apenas cerca de €4 Milhões correspondem a subsídios da Administração Central;
  3. Teve um impacto global sobre o PIB de cerca de €40 Milhões;
  4. Contribuiu para criar 1.296 postos de trabalho, dos quais cerca de 100 directos;
  5. Que corresponderam a €21 Milhões de remunerações;
  6. Gerou €10,8 Milhões de receitas fiscais, suplantando largamente os subsídios da Administração Central.

Se isto não bastasse:
  1. Teve visitas de cerca de 450.000 pessoas, das quais 70.000 estrangeiros;
  2. Desenvolveu um leque de actividades diversificadas: Museu, Serviço Educativo, artes performativas, biblioteca, Serralves em Festa, conferências, exposições itinerantes, etc.;
  3. Incubou Empresas Artísticas;
  4. Em 10 anos, o acervo de obras de Serralves passou de um valor de €6 milhões para 18 milhões.

Tudo isto e os Portugueses ainda podem beneficiar de todas as valências da FS para seu usufruto pessoal que, em algumas ocasiões, é completamente gratuito (aos Domingos de manhã, por exemplo). A Comunidade sai, certamente, imensamente valorizada por ter a FS mesmo que a aritmética financeira não lhe fosse favorável.

A FS é uma instituição de referência internacional e posiciona o País e a região num ecosistema internacional de elevado gabarito. Veja-se o interesse que a contratação do último director do Museu motivou, com a candidatura de centenas de interessados de todo o mundo, e que terminou com a contratação de Suzanne Cotter (ex-Museu Guggenheim).

É óbvio que tal só é possível porque há muito dinheiro privado a acompanhar o dinheiro público (alavancando-o). Por isso, o eurodeputado Paulo Rangel referiu na cerimónia de apresentação do estudo que afinal há PPPs que funcionam! Mais um mito que a FS desfez. Não há nenhuma razão para a Cultura ter no dinheiro público o seu último (e único) reduto. A Cultura tem obrigação de convencer o dinheiro privado a também se comprometer com ela e para ela.

Resta assim à Alice concluir com o que, por outras palavras, se diz no prefácio: a Economia não pode esquecer os benefícios de desenvolvimento civilizacional e os efeitos  económicos primários e secundários da Cultura, bem como a Cultura não pode desprezar a Economia da Comunidade em que se insere, mas antes tem de saber reivindicar os seus efeitos económicos e zelar para os mesmos aconteçam e sejam visíveis.

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