quinta-feira, 12 de setembro de 2013

Vícios Privados e Públicas Virtudes



O tema da reestruturação do Grupo Queiroz Pereira tem sido ampla e detalhadamente veiculado na imprensa. Infelizmente para todos os envolvidos, de forma pouco edificante.

Os factos reportam-se a 2011. Apenas agora se descobrem porque, já diz o povo, “zangam-se as comadres…” e os tribunais portugueses não são de confiança para resolver tão complexo assunto.

A história tem todos os ingredientes de um bom drama (lembram-se do Dallas?): família com tradições históricas, irmãos desavindos, bancos e banqueiros poderosos, dinheiro (muito dinheiro), etc.

No entanto, para a Alice esta história não teria grande interesse (além da curiosidade universal de espreitar quintal alheio) não fosse a empresa que está no centro desta trama ser cotada em bolsa e ter uma quantidade de accionistas institucionais e individuais não desprezível (disclosure: a Alice não tem acções da empresa em questão).

É que este facto muda completamente os contornos do problema. As questiúnculas familiares de PQP ganham dimensão pública pois o que está em causa é uma alteração de controlo de uma empresa cotada que, à luz da legislação do mercado (aqui e em todo o mundo civilizado, financeiramente falando), obriga a uma OPA (Oferta Pública de Aquisição) para dar oportunidade aos accionistas minoritários de venderem a sua posição.

Claro está que os accionistas de controlo preferem não ter de efectuar tal operação. Porquê gastar dinheiro a comprar a posição de uns senhores simpáticos que são donos da empresa sem chatearem muito e sem receberem grande coisa em troca?

A CMVM vai investigar, pedir contratos, actas, etc. e vai chegar à conclusão que foi tudo feito “by the book”, de acordo com a lei. E bem. O problema é que o princípio da forma está sempre à frente do princípio da substância. E os advogados (habilidosos) têm sempre vários instrumentos para “vergar” a lei.

A realidade é que, por muito que os políticos e os agentes económicos glorifiquem os mercados, as grandes operações na bolsa portuguesa são montadas e decididas atrás de portas bem fechadas e os seus contornos últimos são desconhecidos para a maioria dos intervenientes (os milhares de investidores anónimos que são a base para existir qualquer mercado) que, como tal, não podem agir ou tomar decisões informadas sobre as mesmas.

E os casos são muitos e variados.

Veja-se o caso Sonae.com e Zon, da Galp, da própria EDP, todas com uma alteração substantiva dos seus negócios e/ou dos seus accionistas sem que os minoritários tenham tido qualquer oportunidade de “participar” nas decisões sobre as respectivas operações.

Mesmo nos casos em que existiram OPA (Ofertas Públicas de Aquisição), nunca são operações completamente transparentes e isentas de dúvidas.

Cimpor e Brisa são um bom exemplo.

No caso da Cimpor foram alguns accionistas que decidiram vender (a CGD registou neste caso o recorde mundial de rapidez de resposta a uma proposta do género) a outros 2 accionistas que, subsequentemente, partilharam os activos da empresa.

No caso da Brisa, soube-se pela imprensa que a empresa irá distribuir uns dividendos extraordinários aos accionistas e que alguns destes já terão inclusivamente actualizado em alta o valor das suas acções.

Resta acrescentar que ambas continuam cotadas.

Os prémios pagos nestas operações (face às cotações vigentes antes das mesmas) são ridículos quando comparados com os prémios pagos por operações similares nos EUA, por exemplo.

Não há respeito pelos investidores minoritários. Não há vontade de fazer com que os investidores ganhem dinheiro e se sintam bem no mercado. As empresas só pensam nos investidores minoritários quando é necessário dispersar o capital em bolsa.

Apesar da competência e esforço da CMVM, as regras e a praxis dos agentes do mercado não são compatíveis com a transparência, rigor e exigência que se espera neste tipo de esferas.

Depois queixamo-nos de que não há mercado!

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