quinta-feira, 18 de abril de 2013

Os Académicos da Austeridade


Nada move a Alice contra a Academia e os seus Académicos. A realidade é que a Alice também tem uma pequena costela de académica e conhece bem a classe. 

Por isso, compreende o que custa andar meses e, por vezes, anos a estudar um determinado assunto e constatar que a realidade não se adapta à investigação tão arduamente elaborada. 

A reacção típica, nos menos sérios (os aldrabões), é deturpar os números; nos mais sérios (os quixotescos), é ler nos números coisas que eles não dizem. Qualquer das duas abordagens é perfeitamente inócua para o comum dos mortais (i.e. para aqueles que estão fora da Academia) e não representa qualquer tipo de perigo para a Sociedade em geral. Até ao dia em que pessoas menos avisadas (leia-se políticos) decidem pegar nos estudos dos académicos e começar a fazer políticas públicas com base neles. 

Vem isto a propósito do “paper” elaborado em 2010 pelos Profs. de Harvard, Kenneth Rogoff e Carmen Reinhart que concluía que países com dívida pública superior a 90% do PIB têm crescimentos mais baixos. Esta conclusão tem sido esgrimida pelos partidários da austeridade como a explicação científica para defender a bondade da austeridade a todo o custo como forma de garantir crescimento futuro. 

Um grupo da Universidade de Amherst no Massachusetts (o que ainda nos vale é a velha rivalidade entre académicos) repetiu a análise com os mesmos dados e descobriu vários erros de codificação, exclusão selectiva e pesos enviesados nas ponderações. Para resumir os resultados do contra-estudo, para países com dívida pública acima de 90%, a média do crescimento era de 2,2% e não de -0,1%. Diferença considerável não? 

A Alice não vai entrar agora em grandes detalhes sobre as razões destas diferenças, possíveis impactos, etc. Para uma discussão detalhada sobre o assunto, vejam os vários artigos que têm sido publicados pelo FT. 

O que verdadeiramente preocupa a Alice é quando os políticos decidem utilizar estes estudos, os incorporam nas suas decisões políticas e, como consequência, começam a governar com base em folhas de Excel. Esquecem-se por completo de aplicar a ferramenta mais poderosa que o ser humano tem (note-se que nem todos os Académicos a demonstram) que se chama: BOM SENSO. 

E o que é que o BOM SENSO nos diz sobre esta matéria? É simples e a Alice vai resumir em pontos claros e directos para não ser excessivamente maçadora. Não é sabedoria de Harvard, mas é da Asprela em Paranhos: 

- Para efeitos do crescimento do PIB, não é só a dívida pública que conta, a privada também tem impacto; 

- Dívida a mais é má! A necessidade de cumprir o serviço da mesma, acabará por pesar nas contas públicas e privadas reduzindo o crescimento; 

- Dívida a menos também pode ser má! Significa que o País não tem grandes alternativas de crescimento futuro e, sem novos projecto, o crescimento acabará por abrandar; 

- Dívida criada para financiar bons projectos é boa e conduz a crescimento (a construção da primeira auto-estrada entre as duas principais cidades de um País, a infra-estruturação com linhas de comunicação de um País, o investimento em novas refinarias são exemplos de bom investimento); 

- Dívida criada para financiar maus projectos é má (a construção da 3ª auto-estrada entre as duas principais cidades de um País, a construção de estádios de futebol, obras em escolas perfeitamente funcionais, são exemplos de mau investimento); 

- Dívida criada para financiar reduções de impostos pode ser boa para o crescimento; 

- Dívida reduzida através do aumento de impostos pode ser má para o crescimento. 

E é tudo. Não é uma fórmula, é certo. Mas a vida não é uma fórmula e a Alice garante que as decisões tomadas com base nestes princípios genéricos acabarão por ser bem mais eficazes do que as decisões ditadas por fórmulas.

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